A dúvida mais antiga? Putz... sei lá. Deve ter sido algo como “porque esse cara ta me batendo?” e a segunda pode ter sido, “caralho, todo mudo sorrindo enquanto eu choro? Só tem sádico nesse lugar?”. Mas que relevância tem isso? Naquela época ainda haviam algumas dúvidas, agora tudo são dúvidas. E duvido que possa classificar minhas dúvidas em ordem de importância.
Como você duvida de que seja capaz de classificar suas dúvidas por ordem importância, então que diferença ou que semelhança você pode perceber entre tais dúvidas?
A resposta assertiva a respeito da sua questão resolveria parte das minhas dúvidas, porém suspeito que todas as dúvidas tenham algo em comum: por se tratarem de questões sem solução, suponho que todas elas sejam oriundas da provável ausência de conhecimento.
Neste caso, é possível que exista algo que possibilitou o surgimento de uma dúvida em sua mente. Como você lida com isso?
Você tem razão, existem vários “algos” que possibilitaram dúvidas em minha mente. Mas existem dúvidas raízes de todas elas que não serão sanadas. Quando algo possibilita uma dúvida é porque consideramos algumas coisas como certezas, o que é um grande absurdo. Com a ciência, por exemplo, isso ocorre muito. Mas a consideração de uma certeza viola várias de nossas dúvidas. De modo que não há muito a ser considerado sobre uma dúvida oriunda de uma certeza falsa. Voltamos de novo a raiz de tudo: as dúvidas.
As “coisas” são do jeito que são no mundo real, no entanto estamos lidando aqui com o mundo de idéia sobre “coisas”, não das “coisas” em si. Para explicarmos algo, desenvolvemos a linguagem. Para nos expressarmos por meio de tal linguagem necessitamos da dúvida, pois a dúvida nos permite questionar, e por meio do questionamento somos inclinados a desenvolver aquilo que denominamos de conhecimento, i.e., a estrutura representativa das coisas.
As coisas são do jeito que são no mundo real? Que jeito? Que mundo real? Você conhece o mundo real? Ele existe? Talvez estejamos lidando com um mundo de idéias, mas será que essas idéias se referem as “coisas do mundo real”? E se elas são divergentes do mundo real, porque você as chama de conhecimento? Você não ia querer saber se o que você denomina de conhecimento condiz com o que você chama de “mundo real”? Se esse suposto conhecimento viola todas as suas duvidas essenciais, e principalmente, se ele não condiz com o seu mundo real, pra que ele serve?
O problema é que temos dificuldade de lidar com as representações alheias, pois o significado delas encontra-se nas “cabeças” alheias, e para que tais representações façam sentido, precisamos desenvolver nossas próprias representações, permitindo assim gerar novos significados às coisas e.g., novos conhecimentos. Você consegue vislumbrar o mundo utópico ausente de dúvidas?
Isso não me parece um problema tão grande quanto à dúvida a respeito das nossas próprias interpretações (enquanto você usa representação eu prefiro interpretação). Se eu vejo uma vaca voando sofro a minha interpretação primária disso, pensar sobre isso é formular minha segunda interpretação, transformá-la em texto minha terceira. Quando eu falar sobre isso, você não verá o que vi. Bom, mas isso é também irrelevante, porque o que eu vi é tão irreal quanto o que você ouviu. O suposto significado a que você se refere me faz pensar nas religiões, que assim como o “conhecimento”, também são falsas e propõem significados para as supostas coisas. Quanto ao mundo utópico preciso pensar um pouco [...] já pensei.
Para descrever qualquer parte do mundo, inventamos símbolos, gestos, palavras, ou qualquer coisa do tipo, porque aparentemente temos a necessidade de expressar como “vemos” o mundo. Talvez seja nesse momento que aparece a dúvida, inicialmente em nossas cabeças para que depois apareçam em cabeças diferentes. E nessa busca por interpretações, tanto de nossas dúvidas, quanto das dúvidas alheias é que vamos lentamente desenvolvendo a estrutura de pensamento comum que denominamos conhecimento. O conhecimento então seria o conjunto de representações que desenvolvemos ao longo da história humana, que busca dar significado as coisas. O problema é que quando dizemos que tal coisa é um copo, as pessoas são levadas a acreditar que aquilo é um realmente um copo. O mundo real é o mundo utópico ausente de dúvidas, pois se conhecêssemos o mundo real não necessitaríamos de dúvidas, pois saberíamos realmente como as coisas são.
Ai está o equivoco, não descrevemos parte alguma do mundo. Tentamos descrever o que interpretamos com nossos sentidos, e como já disse em outro momento, o que nossos sentidos nos mostram não condiz com a realidade. Então porque perder tempo com eles?
Os sentidos são uma capela. A última morada dos deuses.
Não seria melhor "Os sentidos são como uma capela."?
Não.